quarta-feira, 18 de junho de 2014

Motivos para ver: Malévola


          Uma das grandes mudanças que o mundo cinematográfico vem vivendo, diz respeito ao cada vez mais inexistente uso daquela ideia maniqueísta de separar claramente o bem do mal. Víamos muito isso em filmes infantis, sobretudo os da Disney, onde detectávamos bem rapidamente quem seria o vilão e quem seria a mocinha da história. Algumas produções mais recentes buscaram então humanizar os vilões, ou então tornar mais reais os mocinhos, diminuindo aquele tom idealizado que eles sempre carregavam. Definitivamente, Malévola nos apresenta essa nova proposta. O que a Disney fez foi simplesmente subverter totalmente esta ideia enraizada de que a personagem principal deste filme seria uma vilã má (com seus motivos, mas ainda assim, uma vilã) e tornou a Malévola de 2014 a grande heroína da história, o grande exemplo a ser seguido.

          Malévola traz a história não contada da vilã mais icônica da Disney, do clássico de 1959, A Bela Adormecida. Uma bela e ingênua jovem com atordoantes asas negras, Malévola (Jolie) leva uma vida idílica, crescendo em um pacífico reino em uma floresta, até o dia em que um exército invasor de humanos ameaça a harmonia da região. A fada surge como a mais feroz protetora da região, mas acaba sendo vítima de uma impiedosa traição — um acontecimento que começa a transformar seu coração outrora repleto de pureza em pedra. Determinada a se vingar, ela enfrenta uma batalha épica contra o rei dos humanos e, como consequência, amaldiçoa sua filha recém-nascida, Aurora (Elle Fanning). Conforme a menina cresce, Malévola percebe que Aurora é a peça essencial para estabelecer a paz no reino — e para a sua própria felicidade.

          O sentimento de vingança que leva Malévola a colocar o feitiço em Aurora é bastante compreensível e decorrente da traição sofrida por ela pelo seu então melhor amigo, que viria a ser o Rei. Ainda assim, esse sentimento é anulado com o passar do tempo e com a convivência das duas, a ‘vilã’ e a ‘mocinha’. E ainda, em todos os momentos da história – do início até o seu final, Malévola somente reage, nunca age por livre e espontânea vontade de fazer o mal.

          Linda Woolverton (‘O Rei Leão’) teve a coragem criativa de alterar a clássica história, entregando uma personagem muito mais profunda e tridimensional que aquela que conhecíamos no conto secular. A origem de Malévola como uma personagem feminina do mal nunca foi clara no desenho original, dando liberdade para que a roteirista pudesse fundamentar seus motivos em fatos passados. Malévola não é má, e sim uma mulher com o coração ferido. Suas ações e atitudes são extremamente bem transpostas para a tela por uma sensual e segura Angelina Jolie. Envolvida com a produção desde seu início, a atriz soube construir sua Malévola de maneira esplêndida, tomando a liberdade criativa para que a personagem tivesse um embate interior entre o vilanesco e o heroísmo.

          E por fim, o amor verdadeiro que se tornou um elemento bem icônico na história da Bela Adormecida, nesta versão da história, é dado por ninguém mais, ninguém menos que… a própria Malévola. Mais heroína que isso impossível. O ponto alto do texto é subverter o significado de “Amor Verdadeiro”, demonstrando que este pode ser muito mais grandioso que um príncipe encantado apaixonado. ‘Malévola’ é um filme feminista, e este é seu grande acerto.

          Sim, Angelina Jolie reina quase que exclusivamente no filme. Nota-se que desde o início, essa era a intenção, pois a quantidade de closes em seus lindos olhos é bastante significativa. Angelina ao menos faz a ida ao cinema valer a pena. O visual, ao lado de Jolie, é o grande acerto da produção.

          O Calcanhar de Aquiles da produção é seu roteiro, que alterna entre o genial e o tedioso, e chega a dar sono em alguns momentos menos inspirados. Apesar de conseguir amarrar a maior parte das pontas soltas – menos o motivo de uma garotinha do bem chamar Malévola, percebemos que o texto tem as suas lacunas visíveis. 

          Malévola é fruto de uma nova safra da Disney que repensa seus clássicos para educação de uma nova geração, descartando arquétipos de princesas frágeis e heróis galopantes que salvam o dia com um beijo. Depois de Valente  e Frozen, foi vez da rainha das vilãs revelar ao público que existem outras formas de “amor verdadeiro” além daquelas que oferecem os príncipes encantados. Ainda que a intenção seja louvável, na pressa para criar uma nova moral, Malévola esqueceu-se de contar uma boa história.


Fontes
Omelte: http://omelete.uol.com.br/malevola/cinema/malevola-critica/#.U6GttpRdUuc
Rondonia Dinamica: http://www.rondoniadinamica.com/arquivo/critica-do-filme-malevola,70625.shtml
Cabine Cultural: http://cabinecultural.com/2014/06/05/critica-malevola-so-que-nao/